Empresas precisam se adaptar ao novo sistema de impostos para evitar prejuízos.
O novo pacote fiscal anunciado pelo governo federal tem como objetivo reorganizar a arrecadação pública, diante da necessidade de substituir receitas previstas no decreto que havia elevado as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Após intensas negociações entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e lideranças do Congresso Nacional, foi selado um acordo que prevê mudanças significativas na política tributária brasileira. Esse novo pacote pode sofrer ajustes, já que depende da chancela do presidente da República para ser encaminhado ao Congresso.
Entre os principais pontos do pacote estão a reoneração de produtos e serviços antes isentos ou favorecidos por regimes especiais, como as LCI e LCA, que passarão a ser parcialmente tributadas no Imposto de Renda; o aumento da tributação sobre apostas online — as chamadas “bets”; além de uma ampla revisão dos benefícios fiscais concedidos sem amparo constitucional.
Essas medidas serão, em parte, implementadas por meio de uma Medida Provisória (MP), o que garante efeito imediato, ainda que sua validade dependa de posterior aprovação pelo Congresso. O plano também contempla ajustes na cobrança do IOF sobre operações financeiras como o risco sacado, visando minimizar os impactos negativos em setores sensíveis como o varejo e o setor financeiro.
Mais do que apenas um reajuste técnico das contas públicas, o novo pacote fiscal se apresenta como uma tentativa de reorganizar estruturalmente a base tributária do país.Neste artigo, exploraremos os principais eixos do novo pacote fiscal, seus impactos esperados e os debates que prometem dominar a agenda econômica nos próximos meses. Com informações do Valor Econômico.
A nova tributação das bets e os impactos no setor de jogos online
O novo pacote fiscal do governo também traz mudanças significativas no setor de apostas eletrônicas, conhecidas como “bets”. Um dos pilares da Medida Provisória (MP) é o aumento da tributação sobre a Gross Gaming Revenue (GGR) — receita bruta dos jogos, que corresponde ao total apostado pelos jogadores menos os prêmios pagos. A alíquota, que hoje está em 12%, será elevada para 18%, em linha com a proposta original da equipe econômica apresentada ainda durante a tramitação da regulamentação das apostas no Congresso.
Essa mudança reflete não apenas um esforço arrecadatório, mas também uma tentativa de estruturar um setor que cresceu exponencialmente nos últimos anos, sem acompanhamento regulatório ou tributário adequado. Ao tratar a tributação das bets como parte do novo pacote fiscal, o governo sinaliza que o setor deixou de ser periférico e passou a ocupar papel estratégico no equilíbrio das contas públicas.
Impactos esperados no setor com o novo pacote fiscal
A nova alíquota de 18% sobre a GGR deve gerar um aumento relevante na arrecadação federal, com impacto direto já em 2025. Embora ainda não haja um número oficial consolidado, estimativas preliminares apontam que a arrecadação pode superar R$ 6 bilhões anuais apenas com essa medida.
No entanto, a elevação da tributação também levanta preocupações entre os operadores do setor. Algumas casas de apostas argumentam que o novo patamar pode inviabilizar modelos de negócio com margens menores, principalmente aquelas que atuam com promoções agressivas e altos índices de retorno ao jogador. A médio prazo, há o risco de que parte do mercado migre para a informalidade, especialmente se a fiscalização e regulamentação não forem aprimoradas junto com a tributação.
LCI e LCA deixam de ser isentos: o tratamento do Imposto de Renda no novo pacote fiscal
Uma das mudanças mais sensíveis do novo pacote fiscal diz respeito à tributação de dois dos investimentos mais populares entre os brasileiros: as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA). Atualmente isentos de Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas, esses títulos passarão a ser tributados à alíquota de 5%, segundo a proposta apresentada pelo Ministério da Fazenda. A medida, embora tímida em termos percentuais, representa uma mudança histórica na forma como o governo trata incentivos fiscais no mercado financeiro.
A lógica da mudança: de incentivo à equivalência tributária
A isenção de IR sobre LCI e LCA foi originalmente criada como mecanismo de incentivo ao crédito direcionado para os setores imobiliário e do agronegócio. Ao garantir retorno líquido maior para o investidor, a ideia era estimular a captação de recursos pelos bancos para financiar esses setores-chave da economia brasileira.
O ministro Fernando Haddad defendeu a mudança como uma forma de racionalizar o sistema tributário, sem eliminar totalmente os incentivos. Ao aplicar uma alíquota reduzida de 5%, o governo busca um meio-termo: preserva parte do atrativo dos títulos, mas garante alguma arrecadação sobre esses investimentos, que movimentam bilhões de reais anualmente.
“Títulos isentos vão deixar de ser isentos, mas continuarão bastante incentivados. A diferença de zero para 17,5% vai ser reduzida. Vai ser 5%”, afirmou Haddad em coletiva na noite de domingo.
Efeitos no mercado financeiro e na escolha de investimentos com o novo pacote fiscal
A proposta de tributar LCI e LCA certamente impactará o comportamento de investidores pessoas físicas. Até agora, esses títulos se destacavam por oferecer retornos líquidos superiores a outros produtos de renda fixa com tributação tradicional, como CDBs ou fundos de investimento.
Com a tributação, a diferença entre LCI/LCA e CDB, por exemplo, tende a diminuir, e a escolha entre os produtos passará a considerar outros fatores, como prazo, risco de crédito e liquidez. Apesar de pequena, a alíquota de 5% pode fazer diferença para investidores de alta renda, que aplicam grandes volumes nesses instrumentos com foco em otimização fiscal.
Por outro lado, especialistas apontam que o impacto pode ser limitado no curto prazo, já que a nova regra só entraria em vigor a partir de 2026, respeitando o princípio da anterioridade. Isso dá tempo ao mercado para se adaptar e às instituições financeiras ajustarem suas estratégias de captação.
Reações e possíveis ajustes na tramitação legislativa
A medida gerou reações mistas. Enquanto parte do mercado financeiro e entidades do agronegócio expressaram preocupação com o possível encarecimento do crédito direcionado, parlamentares da base aliada e técnicos do governo argumentam que a medida é necessária para promover maior equilíbrio no sistema tributário.
A expectativa é que durante a tramitação da Medida Provisória no Congresso, haja tentativas de mitigar os efeitos sobre o crédito, seja por meio de ajustes na alíquota, seja pela criação de faixas de tributação com base em prazos ou valores investidos. Há também sugestões para que os recursos arrecadados com essa nova tributação sejam parcialmente destinados a fundos de apoio ao crédito rural e imobiliário, criando uma espécie de compensação indireta.
Além disso, é importante destacar que a LCI e a LCA continuarão sendo títulos com grande apelo, especialmente para investidores conservadores. Mesmo com a nova tributação, a atratividade desses papéis ainda poderá ser preservada, principalmente se os bancos elevarem um pouco a rentabilidade oferecida como forma de compensar o novo cenário tributário.
Corte de benefícios tributários no novo pacote fiscal
Dentro do novo pacote fiscal apresentado pelo governo federal, um dos pontos mais estruturantes — e também mais sensíveis — é a revisão dos chamados “gastos tributários”. Esse termo se refere a toda renúncia fiscal que o Estado concede por meio de isenções, deduções, reduções de alíquotas e regimes especiais que implicam perda direta de arrecadação. O plano do governo é promover um corte de pelo menos 10% nesse volume de benefícios, o que representa um movimento inédito em termos de escala e potencial impacto.
O que são gastos tributários?
Gastos tributários são, na prática, formas indiretas de gasto público. Ao abrir mão de parte dos tributos que seriam arrecadados, o Estado transfere recursos para determinados setores, grupos ou atividades. Embora possam ser instrumentos legítimos de política econômica e social, muitos desses benefícios acabam se tornando permanentes, desiguais e, frequentemente, ineficientes. Em 2023, os gastos tributários federais somaram mais de R$ 450 bilhões, segundo estimativas da Receita Federal.
Esses valores equivalem a cerca de 4% do PIB e são quase metade do orçamento total discricionário da União. A maior parte deles não passa por revisão periódica, nem está sujeita a critérios transparentes de avaliação de impacto.
A proposta do governo
O novo pacote fiscal propõe que pelo menos 10% dos gastos tributários sejam cortados, por meio de uma combinação de medidas infraconstitucionais e negociação política. A ideia é que a maior parte dessas mudanças seja feita por Medida Provisória (MP), o que dá celeridade ao processo e reduz o risco de paralisação por falta de apoio legislativo.
Segundo o ministro Fernando Haddad, setores considerados essenciais — como a cesta básica, o Simples Nacional e a Zona Franca de Manaus — deverão ser poupados. O foco da tesoura está nos benefícios concedidos sem respaldo constitucional e que hoje se mantêm por força de lei ordinária, portarias ou decretos. Isso inclui regimes especiais para determinados segmentos da indústria, deduções seletivas no Imposto de Renda, e incentivos setoriais com baixa eficácia comprovada.
A revisão desses benefícios, segundo o governo, pode gerar um incremento fiscal superior a R$ 40 bilhões em médio prazo. No entanto, Haddad foi claro ao afirmar que esse é um processo que exigirá diálogo político, avaliação técnica e, acima de tudo, critério.
Fonte: Tax Group